Dos riscos trabalhistas do home office

INTRODUÇÃO

1.1 DA DIFERENÇA CONCEITUAL ENTRE TELETRABALHO E O HOME OFFICE

O art. 75-B, CLT define o teletrabalho como a prestação de serviços realizada predominantemente fora das dependências da empresa com a utilização de ferramentas de tecnologia da informação e de comunicação. Além da distância física entre empregado e empresa, o teletrabalho é caracterizado pela exclusividade do serviço, comprometimento do profissional com a instituição considerando o contrato de trabalho firmado entre as partes envolvidas. Isto é, o que diferencia o teletrabalho da forma tradicional de prestação de serviços é que o trabalhador não fica restrito ao espaço da empresa e tem a possibilidade de realizar suas atividades em qualquer outro lugar. O teletrabalho também é conhecido por trabalho remoto.

Por outro lado, não há na CLT conceito que defina a expressão home office. Contudo, a doutrina e a novel jurisprudência trabalhista vêm considerando que o trabalho em home office pode ser caracterizado como o labor desenvolvido em prol da empregadora direto da residência do empregado. De modo que se o teletrabalho ou trabalho remoto é gênero o home office é a espécie.

Em relação ao regramento dessa modalidade de relação jurídica trabalhista, as condições laborais exercidas em home office podem ser reguladas por analogia às regras inerentes ao regime de teletrabalho, às normas gerais de direito do trabalho, às condições pactuadas em contrato individual ou aditivo contratual e em normas coletivas.

Fato é que o trabalho em home office  tem se mostrado a solução mais adequada para o momento de pandemia ao qual vivemos porquanto diminui consideravelmente o risco de contágio e propagação do coronavírus adequando-se, portanto, à responsabilidade legal da empregadora em zelar pela saúde dos trabalhadores.

1.2 DOS CONCEITOS LEGAIS DE ISOLAMENTO SOCIAL E DE QUARENTENA

De acordo com a previsão do art. 2º, I, Lei 13/979/20, o isolamento social se caracteriza como a separação de pessoas doentes ou contaminadas dos demais a fim de evitar a contaminação, proliferação ou a propagação do coronavírus.

Por sua vez, a denominada quarentena diz respeito à separação física entre as pessoas suspeitas de contaminação e as pessoas que não estejam doentes de maneira a evitar a possível contaminação pelo coronavírus. O conceito legal de quarentena está previsto no art. 2º, II, Lei 13979/20.

A diferença terminológica demonstra que o isolamento social somente é recomendado às pessoas comprovadamente infectadas conquanto a quarentena é recomendada a todas pessoas que compõe o grupo de risco, cujos integrantes serão nominados na sequência.

1.3 DA NECESSIDADE DE EXIGÊNCIA DE QUARENTENA AOS EMPREGADOS EM GRUPO DE RISCO OU QUE VIAJARAM PARA O EXTERIOR

A Lei 13.979/2020, sancionada pelo Governo Federal em 06/02/2020, dispõe sobre as medidas de enfrentamento da saúde pública com a chegada do coronavírus no Brasil.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) é considerado integrante do “grupo de risco”:

  • Idosos acima de 65 anos;
  • Grávidas e lactantes;
  • Pessoas com histórico de doenças pulmonares;
  • Pacientes com histórico de doenças, tais como: diabetes, hipertensão e AIDS;
  • Pacientes em tratamento ou pós-tratamento de câncer;

Para os trabalhadores que se enquadram em uma das hipóteses acima, a quarentena deve ser ainda mais rigorosa, já que a taxa de mortalidade pelo coronavírus tende a ser maior.

Relativamente aos colaboradores que fazem parte do grupo de risco ou que não se inclui diretamente neste rol, mas que convivem diariamente ou coabitam com familiares que nele se enquadram, recomenda-se que realizem o trabalho contratado na forma remota, preferencialmente, em home office a fim de minimizar a proliferação da virose.

De igual modo, os empregados que viajaram para o exterior ou que tiveram contato direto com quem viajou estão obrigados a cumprir uma quarentena compulsória, prevista em lei, sem que haja a suspensão da prestação dos serviços que deverá ser mantida em home office. No que diz respeito à comprovação, o empregado deve apresentar ao setor de Recursos Humanos da empresa a cópia do passaporte comprovando que realizou viagem ao exterior ou ainda comprovar que coabita com familiar que realizou a viagem, ainda que não apresente nenhum sintoma relacionado à virose.

Na hipótese de não prestação de serviços em home office o empregado está obrigado a apresentar atestado médico para que as faltas sejam consideradas justificadas. Isso porque a não prestação de serviços em home office não difere da regra geral. Isto é, a empregadora está obrigada a remunerar o empregado nos primeiros quinze dias de afastamento (ou da não prestação dos serviços), sendo que após este período o contrato é considerado suspenso com o devido encaminhamento do funcionário para o INSS, conforme previsão do art. 60§ 3º, Lei 8.213/91[1].

 

2. DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS EM HOME OFFICE

2.1 DOS BENEFÍCIOS

A premissa legal básica do trabalho em home office é que as atividades a serem desenvolvidas na residência do empregado estejam incluídas no rol de atribuições contratadas pela empregadora, conforme previsão do art. 75-C, CLT, sob pena de realização de acúmulo funcional que se traduz no direito do empregado à um “plus salarial”[2].

Para os empregadores, o custo operacional é menor porque não se exige um espaço na empresa. Consequentemente há economia de gastos com energia elétrica, material de escritório (a depender da natureza da prestação de serviços) e não desgaste de instrumentos de trabalho exigido para a entrega do produto final a não ser que a empresa pactue no fornecimento das ferramentas.

Já para o funcionário, o trabalho em home office confere mais liberdade na prestação dos serviços, maximiza o tempo laborado em razão da desnecessidade de deslocamento até a sede da empresa resultando no aumento da produtividade em benefício da empregadora.

2.2 DOS DIREITOS

Como forma de atualizar o regramento referente ao trabalho não presencial, foi promulgada a Lei 12.551/2011 que equiparou a subordinação exercida por meios informatizados àquela exercida presencialmente.

A nova regra alterou a redação do art. 6º, CLT[3], cuja redação atual é a seguinte:

Art. 6º, CLT:Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único:Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.”

Desde que exista um contrato de trabalho estabelecido entre as partes, o empregado que exerce o teletrabalho ou o trabalho em home office têm, do ponto de vista jurídico, os mesmos direitos e deveres que qualquer outro funcionário da empresa que preste serviços presencialmente.

De sorte que a lei garante aos trabalhadores remotos as férias, o recolhimento de FGTS, 13º salário, vantagens previstas em normas coletivas, dentre outros direitos e benefícios previstos em lei e na Constituição da República. É evidente que pela natureza da modalidade, a única vantagem ao qual o empregado não tem direito é o vale-transporte, a não ser que a prestação de serviços exija, em algum momento, a locomoção do funcionário à sede da empregadora.

2.3 DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DE ALTERAÇÃO DO REGIME PRESENCIAL PARA O HOME OFFICE  E DA RECUSA PELO EMPREGADO

Grande parte dos contratos de trabalho firmados entre empresa e empregado autoriza a substituição do regime presencial pelo sistema home office, pois estão de acordo com a previsão doart. 75-C, caput, CLT[4]. Além da base legal, o trabalho em home office possui embasamento em decretos governamentais editados no ano de 2020, como foi o caso da Medida Provisória 927/20 de vigência já expirada.

Aos contratos de trabalho que não prevejam a possibilidade da prestação de serviços em teletrabalho ou home office, é necessário o registro da respectiva alteração em termo aditivo contratual, conforme exigência expressa do art. 75-C, §1º, CLT. Da mesma forma, esta exigência legal se aplica ao retorno às atividades presenciais, caso o contrato ou o termo aditivo não prevejam tal possibilidade.

A anuência a respeito da possibilidade de alteração do local de trabalho expressa em contrato individual bem como a inexistência de prejuízo ao obreiro (que terá os mesmos direitos garantidos na prestação de serviços presenciais) confere ao empregador segurança jurídica quanto à imposição da mudança, conforme previsão do art. 468, caput, CLT[5] e da jurisprudência trabalhista:

“ALTERAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO DE EMPREGADO – NECESSIDADE MÚTUO CONSETIMENTO E INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO AO OBREIRO – ART. 468, DA CLT. A alteração da jornada de trabalho de empregado depende de mutuo consentimento das partes e de inexistência de prejuízos ao obreiro sob pena de nulidade da alteração da alteração contratual, inteligência do art. 468, caput, da CLT. Recurso ordinário a que se nega provimento”. (TRT-22 – RO: 1308200800322007 PI 01308-2008-003-22-00-7, Relator: FRANCISCO METON MARQUES DE LIMA, Data de Julgamento: 10/08/2009, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJT/PI, Página não indicada, 10/9/2009)

A alteração contratual prejudicial vedada em lei se refere àquela em que a nova condição de trabalho se mostra menos vantajosa à anterior, o que não é hipótese dos trabalhadores em questão porquanto a determinação de trabalho em home office se coaduna perfeitamente com as orientações editadas em decretos governamentais e recomendações da OMS. Longe de prejuízo, estamos diante de um benefício. O benefício da proteção à saúde.

Dessa forma, em havendo previsão legal e contratual, tecnicamente, a recusa dos empregados em alterar seu local de trabalho para o home office, notadamente perante à crise sanitária que atravessamos, pode e deve ser considerada uma falta grave na medida em que o poder diretivo (jus variandi) concedido pelo art. 2º, CLT o autoriza a impor sua vontade quanto à forma e ao local de prestação dos serviços quando respeitados as balizas legais.

Prevê o art. 482, CLT:

“Art. 482, CLT: Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

(…) omissis

b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

(…) omissis

h) ato de indisciplina ou de insubordinação”;

Ressalte-se que ainda não há um posicionamento no Tribunal Superior do Trabalho ou de Cortes Regionais Trabalhistas, a respeito da configuração de falta grave na recusa em laborar em home office durante a pandemia quando há previsão e anuência expressa de tal possibilidade em contrato de trabalho ou em termo aditivo de contrato individual. A matéria, de fato, é muito recente. Todavia, para hipóteses mais complexas, como é o caso da mudança de cidade que acarreta em alteração de domicílio, a jurisprudência é clara que em havendo anuência do empregado em contrato de trabalho, a recusa da ordem da empregadora pode ser considerada falta grave a justificar a demissão por justa causa:

“RECURSO ORDINÁRIO. REMOÇÃO DO TRABALHADOR PARA FILIAL DIVERSA. LICITUDE. RECUSA ILEGÍTIMA DO EMPREGADO. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. POSSIBILIDADE. Hipótese em que, no exercício lícito do jus variandi, foi determinada a remoção do trabalhador para filial diversa da empresa, situada no mesmo Município, comprometendo-se o empregador a custear o acréscimo de despesa de transporte (Súmula nº 29 do Col. TST). Sob esse prisma, não há que se cogitar sequer de transferência do empregado, por não ensejar, tal alteração, a necessária mudança de domicílio (art. 469, caput, da CLT). Assim, a recusa injustificada do empregado em trabalhar na nova filial da empresa configura ato de insubordinação do empregado, capitulada no art. 482, alínea h, da CLT, sendo indevidas as verbas resilitórias típicas da dispensa imotivada do trabalhador. Recurso ordinário ao qual se nega provimento. (Processo: RO – 0001341-12.2017.5.06.0313, Redator: Solange Moura de Andrade, Data de julgamento: 28/11/2018, Segunda Turma, Data da assinatura: 28/11/2018 – (TRT-6 – RO: 00013411220175060313, Data de Julgamento: 28/11/2018, Segunda Turma – grifamos)

         De acordo com o mesmo raciocínio, o retorno do home office ao trabalho presencial também pode ser considerado um ato de insubordinação, logicamente quando respeitadas as exigências e balizas legais (art. 482, “h, CLT).

Ao empregado que não concorde com a alteração do local de trabalho, deve ser exigido por parte da empregadora que se assine um termo de recusa ou ao menos que exponha sua negativa de forma escrita, seja por e-mail ou assinada de próprio punho. Caso ainda assim o empregado se recuse a procedê-lo, recomenda-se que seja enviado ao endereço residencial do funcionário uma notificação extrajudicial conjuntamente com o Termo de consentimento mediante aviso de recebimento. O mesmo procedimento deve ser adotado aos empregados que não se manifestaram a respeito do referido termo.

A adoção de tais medidas resguardará segurança jurídica à empregadora para que em uma eventual demanda trabalhista reste devidamente demonstrado que a empregadora adotou corretamente as medidas previstas em lei para garantir a segurança do trabalhador.

2.4 DA RESPONSABILIDADE no FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTOS, maquinário, acessórios E DE OUTROS CUSTOS ASSOCIADOS AO HOME OFFICE

Prevê o art. 75-D, CLT:

Art. 75-D, CLT: As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito”. 

A melhor exegese do art. 75-D, CLT é no sentido de que não há regramento específico que atribua responsabilidade exclusiva à empregadora em fornecer equipamentos e a arcar com os custos da infraestrutura necessária para a prestação dos serviços remotos. Isso porque a lei prevê que a assunção destas despesas é de livre negociação entre a empregadora e o empregado, seja de forma individualizada ou por meio de representação sindical.  

É recomendável relembrar aos empregados eventuais políticas adotadas pela empresa relacionadas ao tema, como por exemplo: benefícios, reembolsos de despesas e etc, para requerer algum tipo de auxílio aplicável neste momento.

Apesar da anuência do empregado em assumir os custos do trabalho remoto, tais como com internet, computador, provedor e etc, existe um risco jurídico considerável neste repasse na medida em que a previsão do art. 2º, CLT é clara no sentido de que recai ao empregador assumir os riscos do negócio não podendo este repassar aos funcionários a obrigação de custear do próprio bolso ferramentas de trabalho para benefício único da empregadora. Diz a jurisprudência trabalhista:

“RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. RISCO DO NEGÓCIO. RESPONSABILIDADE. EMPREGADOR. O empregador é responsável pelo risco do negócio, arcando com eventuais prejuízos decorrentes da atividade econômica nos termos do artigo 2º caput da CLT. Recurso conhecido e não provido”. (TRT 0001325-54.2011.5.11.0014, Rel. Juiza Convocada Ruth Barbosa Sampaio, 3ª turma, DEJT 21/02/2013)

“COMISSÕES. ESTORNOS. IMPOSSIBILIDADE. RISCO DO NEGÓCIO DO EMPREGADOR. Precisamente porque, nos termos do art. 2º consolidado, quem assume o risco da atividade econômica é o empregador, este não pode transferi-lo para o empregado, estornando comissões por cancelamento de vendas ou inadimplência de clientes, ainda mais quando não há prova de dolo ou culpa por parte do obreiro. O estorno só é autorizado na hipótese de insolvência, que não se confunde com inadimplência, nos exatos termos do art. 7º da Lei n.3207/57. (TRT-5 – RO: 1343006520075050008 BA 0134300-65.2007.5.05.0008, Relator: LUÍZA LOMBA, 2ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 11/11/2008)

Segundo a jurisprudência, no trabalho presencial, cabe ao empregador dar ao funcionário as condições para que ele exerça o trabalho porque é ele quem se beneficia diretamente da força do trabalho dos empregados.

A doutrina, por sua vez, não deixa dúvidas que cabe ao empregador arcar com todos os gastos de seu empreendimento, já que “ao se referir à idéia de riscos, o que pretende a ordem justrabalhista é traduzir a idéia de responsabilização do empregador pelos custos e resultados do trabalho prestado, além da responsabilização pela sorte de seu próprio empreendimento”.(DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho, São Paulo, LTr, 3ª Edição, 2004, pág. 394)

Em razão de o home office ser um novo modelo de gestão, os tribunais trabalhistas pouco se pronunciaram a respeito da responsabilidade do empregador em arcar com custos da estrutura utilizada pelo empregado, mesmo quando há previsão contratual lhes atribuindo tais despesas. De toda sorte, nossa conclusão é no sentido de que a assunção de tais despesas, ainda que haja cláusula contratual que destine o custo aos empregados, devem recair ao empregador porquanto além da igualdade de direitos e obrigações entre as modalidades presencial/home office, a norma trabalhista é protetiva e a intepretação dos tribunais tende a se firmar pela responsabilidade da empregadora.

Entendimento contrário pode ocasionar enriquecimento sem causa da empregadora que, nos termos dos artigos 876 e 884,ambos do Código Civil,está obrigada a indenizar o empregado, não só pelo depreciação do seu patrimônio em prol da realização do trabalho contratado, mas notadamente pelo proveito que teve a Fundação em receber o produto da prestação de serviços sem qualquer gasto, quando em realidade é a única interessada no produto final.

As sugestões jurídicas que propomos para a equação da situação são as seguintes:

A) Que a empresa se responsabilize pela montagem e manutenção da estrutura de trabalho do funcionário em home office. De igual modo, que haja fiscalização quanto à questão da segurança do trabalhador agendado previamente com o empregado em virtude do lar ser considerado inviolável nos termos da Constituição da República;

B) Que seja autorizada a leva do material e ferramentas de trabalho, tais como, computadores ou notebook, para a residência dos empregados a fim de, ao menos, reduzir o risco jurídico de um eventual pleito de ressarcimento via judicial. Para tanto, é necessário que seja firmado um termo de responsabilidade ou um contrato de comodato entre a empregadora e o empregado a respeito da concessão dos instrumentos laborais;

C) Pode a empregadora conceder um abono pecuniário para garantir que seus funcionários tenham condições mínimas para continuarem trabalhando de forma produtiva durante a prestação de serviços em home office. A liberalidade de concessão do pagamento não será integrada à remuneração do funcionário, nos termos do art. 75-D, § único, 457, §2º, CLT;

D) Que a empregadora pactue coletivamente com o sindicato da categoria profissional as condições específicas no que diz respeito à responsabilidade pelos custos do trabalho remoto, como por exemplo, reembolso de 50% dos custos com a contratação de provedores de internet, responsabilidade em cumprir horários sem realização de horas extras, cuidados com a ergometria e posição no local de trabalho e etc.

E) Se julgar necessário, a empresa pode contratar um seguro residencial para o empregado que levar ferramentas de trabalho de maior valor. A estratégia evita que, numa ação trabalhista, ele possa argumentar que foi roubado porque mantinha em casa equipamentos caros, de uso exclusivo para empresa, solicitando reembolso e, de novo, juros, correções e outros danos.

2.5 DA JORNADA DE TRABALHO, DO REGISTRO DE PONTO e do sobreaviso EM HOME OFFICE

O eventual direito ao pagamento de horas extras em trabalho remoto, seja home office ou teletrabalho é um aspecto tão relevante (se não mais) quanto a assunção das despesas da prestação dos serviços na residência do empregado.

A peculiaridade específica é que a regra prevista na CLT atribui ao empregador a obrigação em controlar a jornada do seu empregado e esse controle é extremamente difícil – para não dizer impossível – de ser realizado quando o funcionário presta serviços longe da sede da empresa.

Prevê o art. 62, III, CLT com redação conferida pela Lei 13.467/17:

“Art. 62, CLT: Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

(…) omissis

III – os empregados em regime de teletrabalho”.

A novel legislação trabalhista prevê que o funcionário que trabalha em regime remoto, seja em teletrabalho ou em home office  não está sujeito ao controle de jornada, portanto não tem direito ao recebimento de eventuais horas extras prestadas.

Para garantir a segurança jurídica das empregadoras neste momento de pandemia, a Medida Provisória 927 previu que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal não constitui tempo à disposição, prontidão ou sobreaviso da empresa, evitando qualquer discussão a respeito de eventual direito às horas extras em tais hipóteses.

Portanto, o legislador ordinário reformista e o decreto governamental denotam que o horário de trabalho em home office não será fiscalizado em razão da dificuldade do empregador atender a exigência legal prevista no art. 74, CLT. A presunção, portanto, será de cumprimento da jornada no tempo contratado, não havendo que se falar em tempo à disposição do empregador fora do horário previsto no contrato de trabalho.

Noutro giro, é importante observar o conteúdo previsto nas normas coletivas firmadas com o sindicato da categoria profissional para se ter a certeza de que não há disposições em contrário à previsão legal, uma vez que no Direito do Trabalho as normas que visem assegurar mais direitos aos empregados devem ser observadas, conforme previsão do art. 7º, caput, CF. De modo que, apesar da regra geral não admitir pagamento de horas extras em trabalho remoto, o labor em sobrejornada pode ser pactuado entre as partes coletivamente, caso se entenda que a natureza da prestação dos serviços permita a realização do controle da jornada.

A experiência forense nos demonstra que em algumas hipóteses em que o horário de trabalho não pode ser fiscalizado, como é o caso dos trabalhadores externos, a jurisprudência trabalhista passou a admitir a possibilidade de pagamento de horas extras quando se mostra possível comprovar, durante um processo judicial, que o empregador tinha meios capazes de controlar a jornada de trabalho, mas não os utilizou, como por exemplo, a fiscalização da jornada de trabalho de um empregado que somente pode prestar seus serviços acionando o sistema interno da empregadora em que se permite verificar os horários de início e término da jornada de trabalho. Para tais hipóteses, caso o trabalhador extrapole a jornada legal e constitucional estabelecida por meio de contrato ou aditivo contratual, a empregadora deve remunerá-lo com o pagamento de horas extras.

Na modalidade de trabalho fora das dependências da empregadora, é possível haver questionamento em relação ao pagamento de “horas de sobreaviso” na medida em que a empresa pode precisar que o empregado permaneça em plantão, ocasião na qual lhe será devida uma compensação financeira por meio do pagamento do adicional de sobreaviso, conforme prevê a Súmula 428/TST[6], ainda que a jornada ordinária não possa ser passível de controle.

Em complemento, a orientação aos gestores de Recursos Humanos é que, para garantir maior segurança jurídica à empresa, deve haver previsão contratual ou um termo aditivo ao contrato individual de trabalho detalhando as condições de trabalho e as nuances acima mencionadas.

2.6 DA RESPONSABILIDADE E DAS PRECAUÇÕES A SEREM ADOTADAS A FIM DE EVITAR ACOMETIMENTO DE DOENÇAS OCUPACIONAIS E ACIDENTES DE TRABALHO EM HOME OFFICE

A responsabilidade na fiscalização, controle e garantia de ambiente de trabalho seguro e saudável é da empregadora.

Prevê o art. 157, CLT:

“Art. 157, CLT: Cabe às empresas:    

I – cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho;                 

II – instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais;                     

III – adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente;

IV – facilitar o exercício da fiscalização pela autoridade competente”.  

Em relação aos empregados que em razão da natureza dos serviços não podem prestá-los no sistema de home office, mas apenas na forma presencial, a empresa deve se comprometer a fornecer máscaras, luvas, álcool gel, além de higienizar ao longo do dia periodicamente e continuamente a superfície dos equipamentos, maçanetas, puxadores, botões de acesso e chamada de elevadores, bebedouros, catracas, controles remotos e mesas, dentre outras medidas de proteção e higiene.

A importância da adoção das medidas acima consignadas se agigantou após a decisão do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a contaminação de um trabalhador pelo coronavírus pode ser considerada uma doença ocupacional, caso o vírus seja contraído no ambiente de trabalho. A decisão foi proferida pelo Plenário ao que julgar as ADIs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) que questionavam a constitucionalidade de artigos da Medida Provisória 927/2020, em especial o artigo 29 que previa que os casos de contaminação pelo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.

Quanto aos empregados que prestam serviços em home office, prevê o art. 75-E, CLT que “o empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho”.  O parágrafo único deste dispositivo legal consigna que “o empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador”. (grifamos)     

De acordo com a novel previsão celetista, ao adotar o sistema de home office, a empregadora tem o dever de instruir seus funcionários quanto às iniciativas e a adoção dos cuidados que previnam doenças ocupacionais e/ou acidentes de trabalho.

Além disso, a empregadora tem o dever de fiscalizar o cumprimento das orientações e medidas de medicina e segurança do trabalho a serem observadas no trabalho em home office. Dessa forma, a depender da natureza da atividade desenvolvida, há que se ter atenção aos riscos ergonômicos, físicos ou mentais envolvidos na medida em que um ambiente de trabalho insalubre ou inadequado poderá ensejar afastamentos dos empregados por acometimento de doenças daí advindas. Por isso é fundamental que os empregados sejam instruídos, o posto de trabalho seja devidamente fiscalizado e, se possível, custeado pela empregadora[7].

Em relação à efetiva fiscalização do trabalho em home office, é recomendável a visita à residência do empregado (local de trabalho) para averiguação das condições de trabalho, tais como, instrumentos, ferramentas, cadeiras, iluminação e  demais nuances jurídicas que envolvam o labor longe da sede da empresa. Isso porque, além da responsabilidade na fiscalização recair à empregadora, segundo a Constituição da República a residência é inviolável o que exige agendamentos prévios de horários de visita nas residências a fim de minimizar eventuais passivos decorrentes da prestação dos serviços não fiscalizada.

3.    DAS CONCLUSÕES

A intenção das empresas é cumprir sua obrigação legal de zelar pela saúde e pela vida dos seus empregados, enaltecendo a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, cláusulas pétreas em nossa Constituição Federal (art. 1º, III, IV).

A possibilidade de alteração do local de trabalho encontra respaldo na legislação brasileira e, portanto, não há que se cogitar em violação ou óbice jurídico que impeça a implementação ou a manutenção do trabalho em home office.

Portanto, em havendo previsão contratual que autorize a alteração do local da prestação de serviços, a recusa do empregado em trabalhar em home office configura falta grave ensejando a aplicação de justa causa por ato de insubordinação (art. 482, “h, CLT).

Ao empregado que não concorde com a alteração do local de trabalho, deve ser exigido por parte da empregadora que se assine um termo de recusa ou ao menos que exponha sua negativa de forma escrita, seja por e-mail ou assinada de próprio punho. Caso ainda assim o empregado se recuse a procedê-lo, recomenda-se que seja enviado ao endereço residencial do funcionário uma notificação extrajudicial conjuntamente com o Termo de consentimento com aviso de recebimento. O mesmo procedimento deve ser adotado aos empregados que não se manifestaram a respeito do referido termo.

A adoção de tais medidas resguardará segurança jurídica à empresa para que numa eventual demanda trabalhista reste devidamente demonstrado que a empregadora adotou as medidas previstas em lei para a proteção jurídica da empregadora bem como para garantir a segurança do trabalhador.

De mais a mais, o meio mais eficaz de a empresa evitar ou minimizar riscos jurídicos em casos de trabalho remoto é a elaboração adequada do contrato de trabalho ou termo aditivo firmado entre as partes. Todas as informações referentes à prestação de serviço à distância devem estar claramente expressas no documento, em especial as questões relativas à jornada de trabalho do empregado, à responsabilidade do empregador quanto à estrutura fornecida para a execução das atividades e as medidas de segurança a serem observadas.

O suporte jurídico trabalhista e o compliance da equipe interna de gestão asseguram que, além dos riscos da pandemia propriamente dita, não sejam criados mais riscos que proporcionem irreparáveis prejuízos financeiros à empregadora.

É de suma relevância que a empresa, na condição de empregadora, e seus colaboradores se esforcem ao máximo no sentido de manter, ainda que em home office, a mesma produtividade aferida em período anterior à pandemia a fim de encurtar a retomada das atividades essenciais no que se refere ao fim social a que se destina.

Dino Araújo de Andrade – Sócio do escritório Dino Andrade Advogados

 


[1] Art. 60, Lei 8213/91: O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.

(…) omissis

§ 3o Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral. 

[2] ACÚMULO DE FUNÇÕES. PLUS SALARIAL DECORRENTE DA APLICAÇÃO POR ANALOGIA DA LEI 6615/78 (LEI DOS RADIALISTAS). Havendo nos autos prova do acúmulo de funções, é cabível a aplicação por analogia da Lei dos Radialistas para reconhecer o direito ao plus salarial”. (TRT-RO-0085300-11.2009.5.01.0082, Rel. Desembargador, Marcos Cavalcante, 6ª turma, DJRJ 25/07/2012)

[3] Art. 6º, CLT: Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único: Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.”

[4] Art. 75-C, CLT: A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado.

§ 1o  Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.    

[5] Art. 468, CLT: Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

[6]Súmula 428/TST: SOBREAVISO APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 244, § 2º DA CLT. I – O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso; II – Considera-se em sobreaviso o empregado que, a distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o período de descanso”.

[7] Saúde e ergonomia: Implantar o home office com segurança passa por preservar a saúde do funcionário. Para isso, é preciso fornecer a ele móveis adequados, como cadeira e mesa que evitem problemas ergonômicos. O ideal é analisar o ambiente completo em que será feito o trabalho remoto – o espaço ocupado para isso dentro da casa –  e encontrar a melhor solução. Os cuidados com a ergonomia evitam afastamentos e alegação de doenças.

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