Reclamação nos Tribunais Superiores: o que todo advogado precisa saber

Apesar de estar cada vez mais presente nas estratégias processuais, a Reclamação ainda é vista por muitos profissionais do Direito como um recurso distante do dia a dia jurídico. Com aplicações específicas e exigências próprias, o instrumento segue cercado de dúvidas — o que torna sua compreensão um diferencial para quem atua no campo jurídico.

Em tempos de consolidação dos precedentes e valorização da segurança jurídica, entender quando e como utilizá-la pode fazer toda a diferença na estratégia processual.

Para esclarecer os principais aspectos práticos, desafios e possibilidades da Reclamação, conversamos com Dino Andrade, advogado especializado em direito trabalhista e com longa atuação nos Tribunais Superiores. A seguir, ele responde a seis perguntas fundamentais, que ajudam a iluminar o papel desse mecanismo na prática jurídica.

 

1. Para muitos advogados, a reclamação ainda é percebida como um instrumento distante da prática cotidiana. Como o senhor a definiria em termos práticos?

Dino Andrade – A Reclamação é uma ação autônoma já prevista na Constituição Federal e utilizada nos tribunais superiores, que teve seu procedimento reorganizado e detalhado pelo Código
de Processo Civil de 2015. Não é uma ação ordinária ajuizada no dia-a-dia da prática forense. Trata-se de um procedimento judicial especializado que visa preservar a autoridade das decisões vinculantes dos tribunais superiores, em nosso caso, TST e STF.

 

2. Como identificar a necessidade de ajuizamento de Reclamações?

Dino Andrade – A impugnação de decisões judiciais que contrariem precedentes vinculantes dos tribunais superiores pode ocorrer por dois caminhos. O primeiro é o recursal, com a interposição dos recursos cabíveis e o necessário esgotamento das instâncias ordinárias, respeitando as exigências previstas na legislação infraconstitucional. O segundo, mais direto, é o ajuizamento de Reclamação perante o TST ou o STF, conforme a competência do tribunal e a natureza do precedente invocado. Essa escolha dependerá da análise técnica do caso e da estratégia processual adotada.

 

3. Ao optar pela Reclamação, quais os principais desafios na identificação da matéria vinculante?

Dino Andrade – Um dos principais desafios está em identificar se a matéria discutida no caso concreto está, de fato, abarcada por precedente vinculante — seja fixado em Repercussão Geral (STF), IRDR, IAC ou Recursos Repetitivos (TST). Isso exige não apenas domínio dos mecanismos processuais disponíveis, mas, sobretudo, análise criteriosa da tese jurídica firmada no precedente e sua correlação com a controvérsia da decisão impugnada. Nem sempre essa correspondência é evidente, o que pode levar à rejeição da Reclamação por ausência de aderência estrita ao precedente.

 

4. Qual a diferença da Reclamação Constitucional no STF e a Reclamação no TST?

Dino Andrade – A Reclamação ajuizada perante o TST tem como finalidade preservar a autoridade dos precedentes vinculantes firmados no âmbito da Justiça do Trabalho, especialmente aqueles oriundos de Incidentes de Assunção de Competência (IAC), Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) e Incidentes de Recursos Repetitivos (IRR).

Já a Reclamação Constitucional no STF é cabível quando há afronta ou descumprimento de decisões da Corte, especialmente das teses fixadas em sede de Repercussão Geral. Trata-se de um instrumento voltado à preservação da autoridade das decisões do Supremo e à garantia da sua competência.

 

5. Quais os recursos cabíveis para reverter a improcedência de uma Reclamação e quais os erros mais comuns que levam a esse resultado?

Dino Andrade – Contra a decisão que julga improcedente uma Reclamação, os recursos cabíveis variam conforme o tribunal competente e seu respectivo regimento interno. Em geral, é possível interpor agravo interno, embargos de declaração, ou, em alguns casos, recurso ordinário, a depender da instância e da forma como a decisão foi proferida.

É importante observar que, apesar de o CPC/2015 ter disciplinado a Reclamação nos artigos 988 a 993, ainda existem lacunas interpretativas que vêm sendo supridas pela jurisprudência dos tribunais.

Quanto aos erros mais comuns que levam à improcedência, destacam-se o ajuizamento de Reclamação fora das hipóteses legais (como ausência de decisão violadora de precedente vinculante); deficiência na fundamentação quanto à tese aplicável; falta de demonstração do vínculo entre o precedente e o caso concreto; e escolha inadequada do tribunal competente.

 

6. Como a Reclamação tem sido utilizada para garantir a observância de precedentes vinculantes em matéria trabalhista?

Dino Andrade – Considerando a tabela de temas vinculantes recentemente divulgada pelo TST (2025), a parte pode, conforme o caso, seguir a via recursal ordinária ou ajuizar Reclamação diretamente perante o TST, a fim de de garantir a autoridade das decisões da Corte (art. 988, II, CPC) ou, até mesmo, preservar sua competência institucional (art. 988, I, CPC). No âmbito do STF, embora a Suprema Corte tenha definido diversos temas trabalhistas como de repercussão geral, temos percebido que o assunto mais impugnado em sede de Reclamação Constitucional é o Tema 725, que trata da terceirização, especialmente depois que os ministros do STF revisaram sua interpretação, passando a admitir constitucionais outras formas de relação de trabalho, tais como, a “pejotização”, o representante comercial autônomo, o motorista carreteiro, o corretor imobiliário, os advogados associados em escritórios de advocacia, dentre outros, afastando a caracterização de relação de emprego em todas as hipóteses.

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